COMO SE MORRE DE VELHICE
Cecília Meireles
Como se morre de velhice 
ou de acidente ou de doença, 
morro, Senhor, de indiferença. 
Da indiferença deste mundo 
onde o que se sente e se pensa 
não tem eco, na ausência imensa. 
Na ausência, areia movediça 
onde se escreve igual sentença 
para o que é vencido e o que vença. 
Salva-me, Senhor, do horizonte 
sem estímulo ou recompensa 
onde o amor equivale à ofensa. 
De boca amarga e de alma triste 
sinto a minha própria presença 
num céu de loucura suspensa. 
(Já não se morre de velhice 
nem de acidente nem de doença, 
mas, Senhor, só de indiferença.)
